REEQUILÍBRIO, REPACTUAÇÃO ou REAJUSTE CONTRATUAL?

REEQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO

O reequilíbrio econômico-financeiro, recomposição de preços ou revisão é o meio para se reestabelecer o equilíbrio da equação financeira da relação firmada entre a Administração e o contratado (entre o serviço e o preço) prejudicado por superveniência de fato imprevisível, ou previsível, mas de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual. É o que reza o art. 65, inciso II, alínea “d”, na Lei 8666, contendo duas hipóteses de cabimento de revisão nos §§5º e 6º do mesmo artigo.
O fato gerador é comumente o aumento ou criação de algum imposto ou caso fortuito que impacte diretamente o preço da matéria-prima do objeto contratado no mercado nacional ou internacional.

Celso Antônio Bandeira De Mello, acerca desse conceito, preceitua o seguinte (in Curso de Direito Administrativo. 24ª edição. São Paulo – SP: Editora Malheiros, 2007, p. 625-626) :

Equilíbrio econômico-financeiro (ou equação econômico-financeira) é a relação de igualdade formada, de um lado, pelas obrigações assumidas pelo contratante no momento do ajuste e, de outro, pela compensação econômica que lhe corresponderá.

O equilíbrio econômico-financeiro tem fundamento constitucional, na medida em que pode ser reconhecido no texto do artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal:

XXI – ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

(grifos ausentes no original)

Em razão dessa proteção, quando algum dos lados da balança se altera, surge um desequilíbrio que pode ser resolvido de duas maneiras que visam à sua recomposição: o reajustamento de preços e o reequilíbrio econômico-financeiro.

O reajustamento é utilizado para remediar os efeitos da desvalorização da moeda (inflação) e pode ocorrer pela aplicação de índices previamente estabelecidos no edital e no contrato, no caso de obra, fornecimento de bens e prestação de serviços sem dedicação exclusiva de mão-de-obra (reajuste) , ou pela análise da variação dos custos na planilha de preços, no caso de contratos que têm por objeto a prestação de serviços com dedicação exclusiva de mão de obra (repactuação) . Tanto o reajuste quanto a repactuação somente podem ocorrer após o interregno mínimo de um ano, por força do disposto no art. 2º, §1º, da Lei 10.192/2001. O reajuste está previsto no art. 40, XI e 55, III, da Lei 8.666/1993, já a repactuação encontra-se prevista nos arts. 4º e 5º do Decreto 2.271/1997.

O reequilíbrio econômico-financeiro (também chamado por revisão ou recomposição) , por sua vez, tem fundamentos diferentes do reajustamento e não depende de previsão no edital, podendo ser concedida a qualquer tempo ao longo do contrato. Esse instituto encontra-se disciplinado no art. 65, inciso II, alínea “d”, da Lei 8.666/1993, ao estabelecer que os contratos regidos por essa Lei poderão ser alterados, com as devidas justificativas:

d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram inicialmente entre os encargos do contratado e a retribuição da administração para a justa remuneração da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis, ou previsíveis porém de consequências incalculáveis, retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou, ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe, configurando álea econômica extraordinária e extracontratual.

Tal inciso prevê a aplicação da teoria da imprevisão (rebus sic stantibus) aos contratos administrativos. Pertinente a definição de Fernanda Marinela a respeito desse princípio (in Direito Administrativo. 4ª edição. Niterói - RJ: Editora Impetus, 2010, pág. 429) :

...consiste no reconhecimento de que eventos novos, imprevistos e imprevisíveis pelas partes e a elas não imputados, alteram o equilíbrio econômico-financeiro refletindo na economia ou na execução do contrato, autorizam sua revisão para ajustá-lo à situação superveniente, equilibrando novamente a relação contratual. Portanto a ocorrência deve ser superveniente, imprevista (porque as partes não imaginaram) , imprevisível (porque ninguém no lugar delas conseguiria imaginar – algo impensável) e que onera demais o contrato para uma das partes, exigindo-se a recomposição.

Segundo a Lei 8.666/1993, estariam aptos a desequilibrar a balança econômico-financeira estabelecida na assinatura do contrato todos os fatos imprevisíveis ou previsíveis, porém de consequências incalculáveis, desde que retardadores ou impeditivos da execução do ajustado. A aludida lei segue ao especificar algumas das hipóteses, como força maior, caso fortuito e fato do príncipe. Em suma, por não importar tanto ao presente processo, a doutrina conceitua tais hipóteses da seguinte forma:

caso fortuito e força maiorato do homem ou fato da natureza. São eventos que, por sua imprevisibilidade e inevitabilidade, criam para o contratado a impossibilidade intransponível de execução normal do contrato. Nesses fatores incluem-se tempestades, inundações ou, por exemplo uma greve que paralise a fabricação de certos produtos indispensáveis à execução contratual;

fato do príncipe: toda a determinação estatal, positiva ou negativa, geral, imprevista ou imprevisível que onera substancialmente a execução do contrato. Caracteriza-se por um ato geral do Poder Público, como a proibição de importar determinado produto e a indenização do expropriado por utilidade pública.

Em todos os casos, a teoria da imprevisão consiste no reconhecimento de que eventos novos, imprevistos e imprevisíveis pelas partes e a elas não imputados, refletindo sobre a economia ou na execução do contrato, autorizam sua revisão para ajustá-lo à sua situação superveniente.

Caio Tácito (in Boletim de Licitações e Contratos, Set./1993, p. 370-373) menciona que a teoria da imprevisão é uma ressalva extraordinária à regra do cumprimento obrigatório dos contratos. Segundo ele, a sua invocação pressupõe um estado de crise, uma transfiguração inaudita da matéria de fato, que submeta o empreiteiro, inesperadamente, a um prejuízo intolerável.

A teoria da imprevisão, portanto, prestigia a segurança contratual, a fim de impedir a atrocidade que poderia resultar da aplicação irrestrita do princípio da irretratabilidade das convenções. Busca-se atenuar a responsabilidade do devedor, quando a superveniência de circunstância imprevisível que altere a base econômica objetiva do contrato gere, para uma das partes, uma onerosidade excessiva, e, para a outra, um benefício exagerado.

Nos autos do TC 007.615/2015-9, de onde se originou o Acórdão 1.604/2015-TCU-Plenário (Relator: Ministro Augusto Nardes) , o Tribunal decidiu que não há óbice à concessão de reequilíbrio econômico-financeiro visando à revisão (ou recomposição) de preços de itens isolados, com fundamento no art. 65, inciso II, alínea "d", da Lei 8.666/1993, desde que estejam presentes a imprevisibilidade ou a previsibilidade de efeitos incalculáveis e o impacto acentuado na relação contratual (teoria da imprevisão) ; e que haja análise demonstrativa acerca do comportamento dos demais insumos relevantes que possam impactar o valor do contrato.

REAJUSTE CONTRATUAL

Já o reajuste é o instrumento destinado ao realinhamento do valor do contrato em razão da elevação do custo de produção no curso normal da economia, tendo por base índices ou critérios previamente fixados em edital, a fim de preservar a contraprestação devida à contratada do processo inflacionário. Para sua concessão, é indispensável a observância do interregno mínimo de um ano, contado da data da apresentação da proposta ou do orçamento a que essa se referir. Vem previsto no art. 40, inciso XI, e art. 55, inciso III, da Lei 8666 e disciplinado pelas leis 9.069/95 e 10.192/2001 (Plano Real).

Fato gerador e forma: Fato gerador é a perda do valor da moeda durante o período de um ano que é reajustado por um índice econômico como o IPC-A, INPC etc.

Instrução processual sugerida: Requerimento; cópia da Proposta de Preço inicial e outra corrigida com memória de cálculo; Variação do índice econômico, estabelecido no contrato, acumulada no período; SICAF (Situação do fornecedor) ou CNDs, CEIS e CADIN.

REPACTUAÇÃO DE CONTRATO

No âmbito da Administração Pública Federal, quando se fala em prestação de serviços contínuos, planilha de custos e formação de preços de postos de serviços, o instrumento se chama repactuação, disciplinada pelo Decreto 9.507/2018 e pela IN/SEGES 5/2017 alterada pela IN/SEGES 7/2018, cujo critério tem base na demonstração analítica da variação dos componentes dos custos efetivamente ocorridos e comprovados.

Fato gerador e forma: Fato gerador é a data-base do piso salarial da categoria dos empregados terceirizados para a parte da mão de obra e a data da apresentação da proposta para a parte dos insumos diversos (fardamentos e materiais/equipamentos/ferramentas).

Atente-se que os contratos já firmados antes da IN/SEGES 5/2017 continuam regidos pela IN/SLTI 2/2008, conforme seu art. 75 citado abaixo. Todavia, não esqueça de readequá-lo à reforma trabalhista que entrou en vigor em 11/11/2017, pois poderá ter verbas que a empresa não está mais pagando aos empregados e devem ser glosadas, conforme entendimento já firmado pelo TCU, Acõrdão nº 712/2019 Plenário.

Art. 75. Esta Instrução Normativa entra em vigor cento e vinte dias após sua publicação.

§ 1 º Permanecem regidos pela Instrução Normativa nº 2, de 2008, todos os contratos decorrentes dos procedimentos administrativos autuados ou registrados até a data de entrada em vigor desta norma. (Incluído pela Instrução Normativa nº 7, de 2018)

§2º Incluem-se na previsão do §1º deste artigo, as respectivas renovações ou prorrogações de vigência desses contratos, ainda que venham a ocorrer já na vigência desta Instrução Normativa. (Incluído pela Instrução Normativa nº 7, de 2018)

INSTRUÇÃO PROCESSUAL NO PEDIDO DE REPACTUAÇÃO

Na renovação do contrato a empresa deve encaminhar ofício ao órgão manifestando interesse de renovar o contrato mantendo as mesmas cláusulas e condições existentes ressalvando o direito de reajuste/repactuação fazendo constar no Termo Aditivo que existe um pedido de repactuação sendo analisado. Vejamos a documentação:

  • requerimento da repactuação;
  • planilha de custos e formação de preços readequada com o novo piso da categoria impressa e em arquivo eletrônico;
  • cópia da Convenção Coletiva ou Dissídio da categoria homologada pelo Sistema Mediador;
  • Tabela Salarial do sindicato*;
  • relação dos empregados vinculados ao contrato contendo nome completo, CPF, função, remuneração e data de admissão;
  • CTPS original c/ cópias de:
    • folha de rosto com foto do empregado e número da CTPS;
    • Qualificação Civil;
    • Contrato de trabalho com a empresa;
    • alteração de salário contemplando o novo salário da CCT e os benefícios adicionais vigentes;
    • folha de pagamento e contra-cheques com o novo salário, se já houver;
  • SICAF (preferencialmente) ou Certidões de Regularidade Fiscal, Balanço já exigível na forma da lei, CEIS e CADIN (manutenção das condições de habilitação);
  • comprovar os custos, por meio de documentos, da “movimentação dos empregados” no que tange as ocorrências de afastamento por auxílio doença, acidente de trabalho, licença maternidade e paternidade, rescisões e indenizações, assim como, as justificativas de faltas legais (que seriam as variações efetivas dos custos) sob pena de poderem ser glosados na planilha;
  • comprovar os custos de máquinas, utensílios e equipamentos diversos que são repostos anualmente (despesas renovadas).

Fundamento: Anexo VIII-B, DA FISCALIZAÇÃO ADMINISTRATIVA, da IN/SEGES/MPDG nº 5/2017.
*A Tabela Salarial do Sindicato é importante para comparar os cálculos. Veja exemplo anexo pra download no final da página.

PRAZO DA DECISÃO SOBRE REPACTUAÇÃO

A decisão sobre o pedido de repactuação deve ser feita no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, contados a partir da solicitação e da entrega dos comprovantes de variação dos custos, conforme §3º,  do art. 57, da IN SLTI nº 5/2017.

Vejamos alguns cálculos de planilha de custos e formação de preços à seguir que deverão ser adaptados às características do serviço contratado, no que couber, também com observações referentes ao momento da repactuação/prorrogação.

DIREITO À REPACTUAÇÃO PRETÉRITA x PRECLUSÃO LÓGICA

Acórdão 1.827/2008 Plenário: A partir da data em que passou a viger as majorações salariais da categoria profissional que deu origem à revisão, a contratada passou deter o direito à repactuação de preços. Todavia, ao firmar o Termo Aditivo de Prorrogação Contratual sem suscitar os novos valores pactuados no Acordo Coletivo, ratificando os preços até então acordados, a contratada deixou de exercer o seu direito à repactuação pretérita, dando azo à ocorrência de preclusão lógica.

Art. 57, § 7º, IN/SLTI 5/2017: As repactuações a que o contratado fizer jus e que não forem solicitadas durante a vigência do contrato serão objeto de preclusão com a assinatura da prorrogação contratual ou com o encerramento do contrato.

Desta feita, a empresa deve encaminhar ofício à Administração antes da data final do contrato manifestando o interesse em renovar o contrato mantendo as mesmas cláusulas e condições contratuais existentes desde que ressalve o direito de reajuste/repactuação. Apesar de alguns órgãos considerarem a data dessa manifestação ressalvando o direito de reajuste/repactuação, recomendo que a empresa também não assine o respectivo Termo Aditivo sem fazer constar essa ressalva para evitar considerações contrárias em melhor juízo.

Anexo: